24.6.06

PRÉMIO DE ROMANCE E NOVELA

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ESCRITORES


Discurso


Gostaria de agradecer este prémio ao júri que mo concedeu, à Associação Portuguesa de Escritores, que o organiza anualmente, e, claro, às entidades que colaboraram com a APE e o tornam possível.
Já referi antes que nunca pensei recebê-lo e que foi uma surpresa a sua atribuição. Estas palavras podem confundir-se com pura imodéstia disfarçada de desprendimento, mas quem me conhece sabe que são verdadeiras e que a surpresa também o foi. Por isso, a alegria em estar aqui é maior e até mais profunda. As minhas palavras nesta circunstância apenas podem ser de gratidão e de um certo enlevo – e de vaidade, naturalmente, porque somos humanos e devemos viver, ainda que com intensidades diferentes, cada distinção e cada desaire. Distinções e desaires compõem a vida de todos – se bem que, no caso de quem escreve, o desaire deva ser entendido como um livro que não resultou e uma distinção deva ser vista como o reconhecimento pelo trabalho realizado.
Estas designações são sempre subjectivas. Cada um sabe e conhece os caminhos do seu trabalho. Cada um conhece as penumbras e as ilusões que o guiam. Cada um, cada autor, conhece o seu próprio caminho melhor do que ninguém e, por mais que tentemos escrever ou falar sobre o método, as alegrias e as dificuldades do nosso trabalho, há sempre aspectos que não conseguimos traduzir ou descrever. Podemos falar deles, claro, e falar deles com absoluta sinceridade – mas, com alguma probabilidade, não acreditariam inteiramente.
Eu escrevo histórias. De alguma maneira, imagino histórias que me comovem e que gostaria que comovessem os meus leitores. Se há alguma definição, em teoria da literatura, para o género de romance que eu gosto de escrever, acredito que seria essa. E que a frase decisiva seria essa também: “Eu escrevo histórias.” Acho que escrevo histórias porque gosto de ler as histórias dos livros dos autores que aprendi a amar desde a infância e a adolescência. Algumas delas duram mais na memória e, também aí, os factores que levam uma história a permanecer na nossa memória são também subjectivos. Podemos tentar explicá-los, mas há sempre qualquer coisa que sobrevive numa leitura – e que não conseguimos descrever. Por isso, uma das palavras de que mais gosto é “poeira”. A poeira das estradas no meio da floresta. A poeira dos caminhos. A poeira do deserto. A poeira do céu, aquela nuvem que atravessa a geografia de todos os lugares onde estivemos. A poeira, enfim.
Eu escrevo histórias, portanto, e gosto da palavra “poeira”. Tal como gosto da palavra “perturbação”. Da palavra “paisagem”, da palavra “lugar”.
Talvez por isso, por eu gostar de escrever histórias que algum dia me comoveram, não posso falar em nome dos outros nem acho que o trabalho do escritor, seja ele contador de histórias ou não, deva ser realizado em nome de outra coisa senão da alegria de escrever e, por interpostas pessoas, da alegria de ler.
Escrevo histórias porque não acredito num mundo sem história, sem memória e sem perturbação. A história e a memória mostram-nos que vivemos com os outros e que são os outros que justificam todas as narrativas; sem os outros não teríamos ninguém para contar histórias, não teríamos ninguém para ouvir as nossas histórias, ou seja, não teríamos com quem viver. A perturbação, por seu lado, ensina-nos que a pequena verdade de cada um, a pequena verdade dos outros, pode pôr em causa a nossa verdade absoluta, aquela em que acreditamos.
No meu caso, os outros, além dos meus leitores, dos meus filhos, dos meus pais, dos meus amigos mais chegados, os outros são os meus personagens. Comecei este breve discurso agradecendo o prémio. Terei de agradecer também aos meus personagens, aos personagens dos meus livros. Sem eles eu não teria conseguido escrever nem contar histórias, nem ter vivido os momentos dessa estranha e no entanto intensa felicidade que é a de ver que, subitamente, esses personagens já não dependem de mim mas da vida inteira, da vida que vem nos livros. Conheço o inspector Jaime Ramos, o detective de “Longe de Manaus”, há algum tempo. Há cerca de quinze anos que ele vive comigo e que eu conto as suas aventuras. De alguma maneira, como vêem, nem as histórias me pertencem, mas sim aos meus personagens. É verdade que o detective Jaime Ramos só existe porque eu o inventei, ou o criei, ou o escrevi. Mas isso acontece porque ele vive, melhor do que eu, esse mundo de perturbação e de poeira onde situo as minhas histórias. Ele é um homem vulgar e céptico. Talvez um pessimista, até. Tem hábitos vulgares. A sua excepcionalidade, o que para mim se revelou excepcional no seu carácter, foi a sua capacidade de permanecer vulgar, céptico, dedicado, tranquilo, apesar da vida inteira, a sua e a dos outros. Agradeço-lhe ter aceite este papel de personagem dos meus livros. Agradeço aos outros personagens que os habitam: ao inspector açoriano Filipe Castanheira, por exemplo, que não entra neste livro, mas que começou a minha série de histórias policiais. A Daniela e a Helena, de “Longe de Manaus”, por quem me apaixonei. Ao brasileiro de Manaus, Osmar Santos, que me proporcionou muitos momentos de riso. Ao detective Isaltino, a quem admiro a sua modéstia tremenda, de homem humilde. Agradeço à namorada de Jaime Ramos, Rosa, que não me importaria de ter conhecido antes de escrever os seus diálogos. E estou grato, evidentemente, aos lugares que aparecem no livro – o Porto, Trás-os-Montes, o Douro, a Guiné, Cabo Verde, Angola e, naturalmente, o Brasil. Se não existissem esses lugares, não teria podido escrever. Graças a eles viajei bastante.
Mas sobre muitas outras coisas, estou grato à língua que usam os nossos escritores – os nossos, os escritores de língua portuguesa. Este livro tem duas ortografias, a portuguesa e a brasileira, mas serve-se de uma única língua, divertida, dramática, pueril, fantástica, sitiada, brincalhona, empertigada, humilde, e dividida por vários continentes onde já não depende de nós, portugueses, mas de todos os que a falam independentemente de nós – e essa é a sua melhor promessa, a nossa melhor herança. É por ela que falam os nossos mestres, de Luís de Camões e Fernão Mendes Pinto a Machado de Assis, Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Cesário Verde ou Fernando Pessoa. Eu acho que devemos venerar os mestres e as suas lições, as que atravessam o tempo e sobrevivem às inclinações do mundo, as que vêm de Fernão Lopes a Rubem Fonseca, de Sá de Miranda a Vergílio Ferreira e José Cardoso Pires. Eles são os mestres da nossa língua e a garantia de que ela existe para lá e para além dos dicionários do presente. Se algum dia a escola tiver dúvidas sobre a nossa língua, eles estão aí. Sem eles não poderíamos falar da nossa língua.
Há também um nome que gostaria de referir aqui, o de Miguel Real, autor de “Em Nome da Terra”, um livro notável que foi finalista, comigo, nesta escolha do júri do Prémio APE. Miguel Real é um autor muito raro e de altíssima qualidade, e o seu livro é uma fantástica narrativa sobre uma parte da História de Portugal. Foi das primeiras pessoas a felicitar-me porque ambos sabemos que eu seria também uma das primeiras pessoas, senão a primeira, a felicitá-lo, como já aconteceu de outras vezes.
Não quero terminar a lista de agradecimentos sem mencionar uma pessoa a quem estou ligado por laços muito mais fortes do que a simples relação, digamos, literária. Falo do meu editor Manuel Alberto Valente. Em vários momentos em que o meu pessimismo ultrapassava o do próprio detective Jaime Ramos, o meu editor ensinou-me que vale a pena insistir, persistir, não dormir às vezes, e sobretudo não ceder ao que não devemos ceder. A sua companhia, ao longo destes últimos quinze anos, foi também preciosa e não podia esquecê-lo agora.
Um prémio agradece-se. Ele honra-nos e provavelmente traz-nos alguma responsabilidade acrescida. Agradeço-o, portanto, e sinto-me honrado. A minha única responsabilidade, no entanto, é apenas para com o meu próximo livro, para com a minha próxima história.

[Francisco José Viegas]

12.6.06

Francisco José Viegas vence Grande Prémio de Romance e Novela da APE
07.06.2006 - 19h02 Lusa

O livro "Longe de Manaus", de Francisco José Viegas, é o vencedor do Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores 2005.

Trata-se de um mais importantes prémios literários portugueses, no valor de 15 mil euros, e foi atribuído por maioria por um júri constituído por José Correia Tavares, que presidiu, Liberto Cruz, Luis Mourão, Luiz Fagundes Duarte, Serafina Martins e Teresa Martins Marques, informou a Associação Portuguesa de Escritores (APE).

Segundo a APE, o número de livros admitidos ao concurso (90) foi o maior desde a primeira edição do prémio, há 24 anos.

Dois dos seis membros do júri do Grande Premio de Romance e Novela da APE votaram na obra "A Voz da Terra", de Miguel Real, indicou a instituição.

O prémio é patrocinado pelo Instituto Português do Livro e das Bibliotecas, Câmara de Grândola, Fundação Gulbenkian, Imprensa-Nacional Casa da Moeda, Instituto Camões e Sociedade Portuguesa de Autores.

Francisco José Viegas é actualmente director da Casa Fernando Pessoa, tendo exercido antes cargos de direcção em jornais e revistas.

Nascido em 1962 em Vila Nova de Foz Côa, viveu na aldeia de Pocinho até aos oito anos, mudando-se então com a família para Chaves, onde fez os estudos secundários. Formado em Letras pela Universidade de Lisboa, Viegas foi professor de Linguística na Universidade de Évora.

Jornalista, escreveu para jornais e revistas como o "Jornal de Notícias", "Diário de Notícias", "O Independente", "Visão", "Ler" e "Grande Reportagem". Actualmente, apresenta com periodicidade semanal programas culturais na rádio e na televisão.

Data de 1983 a sua estreia em livro, na Poesia, com "Olhos de água", a que se seguiram "As imagens", em 1987, o ano em que publicou o seu primeiro romance, "Regresso por um rio". A sua obra poética inclui ainda títulos como "Todas as coisas", de 1988, "O Medo do inverno seguido de poemas irlandeses", de 1994, e "O puro e o impuro", de 2004.
Na ficção, Viegas escreveu "Crime em Ponta Delgada", de 1989, "Morte no Estádio", de 1991, "As duas águas do mar", de 1992, "Um crime na exposição", de 1998, "Lourenço Marques", de 2002, e o agora premiado "Longe de Manaus", de 2005.

São ainda de sua autoria uma peça de teatro, "O segundo marinheiro", de 1988, e, publicado neste mesmo ano, um livro de viagens, "Comboios portugueses".

Várias das suas obras estão traduzidas na Alemanha e em França.

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Francisco José Viegas distinguido com Grande Prémio de Romance e Novela da APE








Francisco José Viegas, galardoado esta quarta-feira com o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores (APE), é um dos mais jovens escritores a receber esta distinção, atribuída a autores portugueses desde 1982.

Viegas tem 44 anos. Nasceu em 1962 em Vila Nova de Foz Côa, fez os estudos secundários em Chaves, formou-se em Letras na Universidade de Lisboa e desenvolve desde então, a par da escrita, actividades múltiplas de divulgação cultural, na rádio, nos jornais e na televisão.

Hoje, numa primeira reacção ao anúncio do prémio, disse à Lusa ter ficado "surpreendido e ao mesmo tempo contente" com a distinção, que considera "um estímulo".

Viegas estreou-se nas letras em 1983, aos 21 anos, com uma recolha poética a que deu o título de "Olhos de água".

Quatro anos depois, publicou um novo título poético, "As imagens", e lançou a sua primeira ficção, "Regresso por um rio".

"Excelente poeta", na opinião do também poeta e ficcionista Vasco Graça Moura, o anterior vencedor do prémio com o romance "Por detrás da magnólia", Viegas deu já à estampa, 23 anos volvidos sobre a sua estreia, seis livros de poesia e nove de ficção.

Graça Moura, como aliás outros dos autores contactados pela Lusa - casos de Jorge Saramago e Agustina Bessa-Luís - não leu o hoje premiado "Longe de Manaus", mas tem da obra anterior do autor opinião positiva.

São, em seu entender, livros com "um resultado muito bom" e "grande eficácia literária".

Para Lídia Jorge, distinguida com o Grande Prémio em 2002, com o romance "O vento assobiando nas gruas", "Longe de Manaus" é "o melhor livro" de Viegas.

"É - disse à Lusa - um livro estupendo, que tem um enredo policial, mas também uma natureza psicológica e mítica, e que junta dos perspectivas, a portuguesa e a brasileira".

Baptista-Bastos entende ter sido "mais do que merecido" o Prémio atribuído a Viegas, porque "Longe de Manaus" é "um belíssimo romance de um grande escritor da língua portuguesa".

"Escreve - disse o autor de "Cão velho entre flores" - um português admirável, coisa que vai sendo cada vez mais rara nos escritores e nos jornalistas portugueses".

A obra ficcional de Viegas inclui títulos como "Crime em Ponta Delgada", "Morte no estádio", "As duas águas do mar" e "Lourenço Marques", romances assentes em tramas policiais mas não se limitando a um desenvolvimento linear desse "esquema".

Escreveu ainda uma peça de teatro, "O segundo marinheiro", e um livro de viagens, Comboios portugueses".

Actualmente, é o director da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa.

O Grande Prémio de Romance e Novela da APE registou na edição deste ano um número recorde de obras concorrentes, 90. O seu valor pecuniário é de 15.000 euros.

Nas anteriores edições foram distinguidos autores como José Cardoso Pires, Augusto Abelaira, Saramago, Agustina Bessa-Luís, David Mourão Ferreira, Vergílio Ferreira, Mário Cláudio e António Lobo Antunes.

Agência LUSA
2006-06-07 20:32:02

6.6.06

A Sagres é a mais tradicional das cervejas portuguesas, nascida em 1940. Exactamente: durante a Exposição do Mundo Português e as comemorações do Império. Daí que, doravante, a sua história esteja, também, ligada à história do design de bebidas em Portugal e, na verdade, à história da própria cerveja entre nós. Durante anos criou-se a ideia, sem dúvida desmesurada e estranha, de que se tratava de uma cerveja pesada. Erro. A Sagres foi, quase sempre, uma cerveja bem feita, bem preparada e, enfim, razoável. Os seus apreciadores detectavam nela uma simplicidade atraente e natural que os bebedores mais jovens não conseguiram compreender. Cometeram-se algumas maldades contra a Sagres. De alguma maneira, a cerveja evoluiu e abriu mais o paladar e a sua cor. Na boca reconhece-se a suavidade do malte, um tom seco, e a presença do lúpulo. Tem algum corpo, reflexos dourados, e um tom amargo que se solta do último suspiro do bebedor; a espuma é muito aberta, o que é uma pena porque muitas vezes se perde – mas o bom apreciador sabe como obter uma espuma correcta e suculenta. Sedosa, textura bastante aceitável, nada que lembre uma cerveja aguada e sensaborona, própria para almas desinteressantes.


+MARCA: Sagres
Origem: Portugal
Álcool: 5,1%
Avaliação: ***

O mundo das cervejas pretas está a mudar em Portugal. Em primeiro lugar, uma parte dos bebedores de cerveja começa a distinguir aquilo que é uma stout de várias coisas como uma dunkel ou apenas uma vaga imitação escura de outras cervejas de tom mais marcado. O apetite pelas cervejas escuras vai aumentando à medida que a qualidade dos bebedores aumenta; ou seja, aumenta o seu interesse pelas boas cervejas que não são, apenas, refrescos com alguma intensidade alcoólica ou amargor de lúpulo. A Super Bock preta apresenta-se como uma stout, e tem razões para o fazer – a essencial tem a ver com a sua densidade, e nisso é a melhor das pretas portuguesas.
Trata-se de uma boa tentativa de fazer uma stout sem excesso de caramelo e com um leve tom de chocolate em dose aperfeiçoada; tem um tom de fruto e de licor inesperado, e uma complexidade que se revela num sabor duradouro. Harmonia entre a carbonatação moderada e a suavidade proporcionada pela fermentação. Com maior densidade, o seu aroma seria (ainda mais) recompensado e ficaria mais amarga. A espuma duradoura é um presente para os bons bebedores que apreciam aquele momento em que a cerveja cai no copo e se despede para sempre da letargia em que nos aguardou – e um prémio para a persistência.

+MARCA: Super Bock Stout
Origem: Portugal
Álcool: 5%
Avaliação: ****
A minha peregrinação em busca da ruiva ideal passa, necessariamente, pela Super Bock Abadia, que foi um sucesso de mercado, tal como a sua rival directa, a Sagres Bohemia. Eu aprecio este tipo de cervejas, onde a coloração se obtém a partir de maltes trabalhados e intensos. O resultado é uma cerveja com certo tom de caramelo, de reflexos alaranjados e vagamente amargos. A Abadia não tem o amargor de outras cervejas semelhantes; pelo contrário, é suave e muito ao gosto popular, o que nem sempre é bom, embora garanta presença e acabe por tornar os seus bebedores em cidadãos mais exigentes. Bem vistas as coisas, a Abadia regista pouca intensidade para uma ale, que poderia ser bem mais “amanteigada” e com corpo mais denso. Aquele leve piquinho de citrino acaba por se transformar em sabor de frutos maduros, o que lhe dá um certo ar exótico. Mantém uma das características da Super Bock no andamento lager – a frescura. Já quanto à sua espuma, convém agitar o copo para que ela não se perca. Ao volteá-la descobre-se uma respiração folgada e intensa (atenção aos 6,4% de álcool), muito adequada a cervejas deste tipo, que não pretendem apenas servir de refresco ou de antídoto contra o calor do Verão, mas também transmitir um sabor especial, neste caso ligeiramente adocicado e frutado.

+MARCA: Super Bock Abadia
Origem: Portugal
Álcool: 6,4%
Avaliação: ***
Aprecio nas cervejas escuras o seu apelo à contenção, o seu peso e a suavidade. Não são coisas contraditórias. Ao contrário das cervejas claras, lagers clássicas e pilseners de eleição, as cervejas escuras ou mais escuras (stouts, ales, dunkels, de ruivas a pretas) chamam por nós naquele momento em que a boca se desfaz do líquido e o deixa seguir caminho; ou seja, a cerveja vai, parte, mas nós ficamos cá do alto, vigiando a descida esófago abaixo, se é que ela desce alguma vez pelo esófago – coisa que, por elegância, acredito que não fará. A designação de cerveja preta quase nunca é muito precisa, pois abarca uma série de identidade e de categorias muito distintas. A Tagus, que é uma boa lager, lançou agora a Magna, que se junta às outras cervejas escuras portuguesas. Recomendo que se proceda à sua prova: em primeiro lugar, não se trata de uma stout, antes aparece como uma dunkel de estilo alemão, quase regulamentar e bávaro, embora com um tom mais doce ou caramelizado. Olhada à luz, faz-nos tremer ligeiramente: o copo, transparente, revela um tom rubi profundo e nada envergonhado. E, se é mediana no seu aroma (nada de profundo, de facto), o paladar compensa bastante, com uma evocação simpática de sabores em suspensão, volteando e rodopiando naquele final de boca acentuado. Só o facto de não trazer impresso «stout» no rótulo é já uma coisa honesta. De facto, é uma boa dunkel portuguesa.

+MARCA: Magna
Origem: Portugal
Álcool: 5%
Avaliação: ***
Eu não vejo grande inconveniente em fazer-se cerveja com ananás, abóbora, rabanete, gasolina de avião, álcool etílico ou com ginja. O importante é haver quem a beba; não me apanharão em campanhas de rua a exigir a pureza absoluta da cerveja ou de qualquer outra coisa. Em África já me ofereceram vinho branco com Coca Cola e eu recusei – mas havia bastante gente à minha volta a segurar na mão o copo com a mistura. De volta à pátria real, descubro uma cerveja com aroma de limão e uma campanha publicitária que fala da sua leveza e dimensão angelical. Estranhei que não a tivessem feito antes – à mistura, porque a publicidade nem era má. Nada disso me incomoda, nem acho criminoso desde que não me obriguem a bebê-la em doses normais. Basta cheirá-la. Há quem invoque o hábito mexicano de tingir a claridade radical das suas cervejas com umas gotas de limão ou, mesmo, de nela mergulhar um quarto de lima para lhe transformar o sabor, tornando-a ligeiramente doce; nem isso me parece uma exclusiva mexicanização: na Europa há cervejas com um leve toque cítrico que não desconhecem de todo o caminho do pódio – pelo contrário, são muito agradáveis. Não são aquela cerveja. Não. Mas não erguerei o cadafalso para penalizar os seus autores. Ora, por falar em campanhas publicitárias de cerveja em Portugal há uma que gostaria de recordar; diz: «É boa.» Voltar à pátria a espaços tem destas vantagens: eu já conhecia a cerveja mas tinha-me passado a campanha. Não é despropositada – a Tagus é uma cerveja muito apreciável, claramente lager, seca e com um tom colorido bastante apetitoso, cerealífero. Herdeira da tradição das pequenas indústrias locais (que produziram em Portugal marcas como a Marina, Clock, Cergal ou Topázio), é necessário saber aprender a beber a Tagus: não é vulgar nem excessivamente gaseificada, como acho que pede o gosto português; tem um aroma quase perfeito e um sabor que ronda o limão, frutos frescos e um final de noz. É boa. Quer dizer: a campanha não mente. É boa e pronto. Malte puro, água pura, lúpulo – com isso se faz uma cerveja.

+MARCA: Tagus
Origem: Portugal
Álcool: 4,5%
Avaliação: ***
Nas cervejas, como em muitas outras coisas da nossa vida, há obsessões e hábitos adquiridos com a prática. A Super Bock é um dos selos da identidade do malte & lúpulo português – e, convém esclarecer, não tem nada a ver com a designação bock, que diz respeito a uma cerveja de sabor intenso, de teor alcoólico mais elevado (chega aos 16 e, no caso das Dopplebock, aos 18%), ligeiramente mais doce, originária de Einbeck (Baixa Saxónia) e que depois adquiriu diferentes significados – todos eles relacionados com a “qualidade do fabrico”. Durante muitos anos, o principal argumento do bebedor de cerveja em favor da Super Bock tinha a ver com a sua leveza de carácter. Era um ponto a seu favor, admito: transparência mais admirável no copo, uma espuma aceitável (ainda que sem muita densidade) que protegia o borbulhar, cor mais apetitosa em meses de canícula. Na verdade, era a lager portuguesa mais fácil de beber. Essa característica não se alterou muito: a Super Bock mantém um tom de frescura, ligeiramente afrutado e que tem vindo a melhorar. Na boca, começa por ter um vigor intenso que depois passa a amargo. Os seus apreciadores detectam esse final muito equilibrado que não lhe retira peso como uma cerveja que cumpre a sua função – dessedentar, refrescar, ser uma pale lager de referência, seca de paladar e limpa quando vista diante da luz. Há cervejas que têm apenas essa característica e não vem daí mal ao mundo.


+ MARCA: Super Bock

Origem: Portugal
Álcool: 5,6%
Avaliação: ***

A cerveja brasileira tem os seus admiradores pelo mundo fora – e os portugueses aceitam, de bom grado e com santa ingenuidade, que se trata, em geral, de uma cerveja superlativa. Na verdade, há casos. Mas convém relembrar que uma cerveja é o modo como ela é construída e a circunstância em que é bebida. Portanto, num cenário idílico em que as poeiras dos trópicos transformam o nosso carácter e nos conferem uma certa dose de perturbação dos sentidos, até uma Antárctica pode parecer uma boa cerveja. Mas não é. Ora, ao contrário do que se pensa, é cada vez mais difícil fabricar más cervejas. Depois de passar dois anos a escrever sobre o assunto, semanalmente, raramente encontrei más cervejas – em todo o mundo. A Sagres, que lançou uma razoável cerveja ruiva há um ano (seguida pela Super Bock, que lançou a Abadia), acaba de disparar para o mercado com a Sagres Chopp, tentando vender a imagem de uma «cerveja brasileira», leve e suave. Não conseguiu. Não tem espessura de «chopp» (que só se obtém verdadeiramente, em todo o seu esplendor, em barril), não tem a sua gloriosa espuma, não tem o seu sabor de coração frio. O rótulo é feio e desagradável, de design cavernícola – e a “carica” nem a marca leva impressa. Aroma, quase nenhum; sabor, amargo demais mas sem personalidade. Experimentei seis garrafas em copos diferentes e foi sempre desilusão. Não tem sabor, não é – ao contrário do que a sua publicidade afirma – leve e possui uma densidade que até na cor se manifesta. Um falhanço.

+MARCA: Sagres Chopp
Origem: Portugal
Álcool: 5%
Avaliação: *
Regresso à pátria depois de uma viagem pelo sul do mundo, e encontro-a cheia de novidades; não me refiro ao futebol, à política ou à meteorologia. Falo da cerveja. Tinham-me já escapado a viseense Tagus Magna, uma dunkel que não me arrependo de gabar, e a madeirense Coral Tónica, uma aproximação ligeira à dunkel. Mas eu não queria que me fugisse a Bohemia, a nova experiência da Sagres. O leitor já sabe que essas cervejas avermelhadas me caem no goto. Aliás, caem bem sobretudo no estômago (já aqui mencionei a Murphy’s Red), são ligeiramente digestivas, afrutadas e, quando servidas de acordo com as regras, a sua espuma flutua como os pássaros num poema de Yeats. A imagem é exagerada, mas é para que o leitor compreenda. É preciso dizer, antes de mais, que não se deve beber uma red do mesmo modo como se bebe uma lager simples. Há horas para tudo. Com certeza, a Bohemia não é a cerveja indicada para refeições substanciais, pois o seu açúcar pode confundir-nos o paladar – o aroma é intenso, solta-se em vagas que nos transportam até outras latitudes. Deve beber-se com concentração e desprendimento. A Bohemia cumpre as indicações (faltando-lhe aquele tom de manteiga que a fecharia mais um pouco) e seria uma pena que passasse despercebida; devemos felicitá-la pela cor e pelo aroma, que tem um final muito apreciável, que evoca maçã e frutos em maturação. Ao servi-la, atenção!, provoque-lhe uma espuma substancial. E já sabeis, leitores, qual é a minha divisa nessas circunstâncias: «Vinde a mim, ruivas!» Já é obsessão.

+MARCA: Sagres Bohemia
Origem: Portugal
Álcool: 5,6%
Avaliação: **
Para festejar o início da produção na Cervejaria da Trindade, apareceu a Sagres Bohemia 1835, uma variante mínima da Sagres Bohemia anterior. Na verdade, trata-se de uma correcção da nova marca, com um ligeiro toque de fruto no seu carácter – mais aveludada, menos amarga no seu final de boca, e mais intensa no aroma. É uma homenagem ao interessante mito dos bons frades que amavam a cerveja e a fabricavam para prazer dos homens e glória do Divino. Não me parece mal. Se fizerem a experiência, num copo adequado, a Bohemia 1835 produz uma espuma mais densa do que Bohemia normal, o que leva a pensar que é uma pena tratar-se apenas de uma série limitada. Há uns tons (mas isso depende da imaginação do provador) de cereja e frutos maduros, muito mais indicados para uma cerveja deste género – e que a afasta definitivamente do gosto popular (o que é bom), dando-lhe notas de requinte e de exotismo, conferindo-lhe densidade e tornando-a mais apetitosa. Por instantes, num final de Primavera, pode mesmo parecer uma cerveja de bar, bebida ao balcão em copo de pint (a meu ver mais adequado, para esta Bohemia 1835, do que o formato belga) uma vez que não precisa tanto de respirar nem de correr o risco de oxidar. Pelo contrário: é uma cerveja que deve beber-se em goles cheios, fustigando as papilas e mostrando-lhes que é possível produzir uma ruiva aceitável, muito aceitável, com as cores nacionais. O bebedor não sabe como se consegue isso, mas dá-se conta de que há uma melhoria. E isso é bastante. E já é muito.

+ MARCA:
Sagres Bohemia 1835
Origem: Portugal
Álcool: 5%

Avaliação: ***
Várias vezes me têm perguntado quais são as melhores cervejas portuguesas – é um risco necessário e natural. Por sorte, mais do que por aquela natural sapiência que um cronista devia ter (e não tem), tenho podido evitar respostas. Tenho a minha lista. No topo, silenciosas, seguem as minhas três de eleição. De duas delas já escrevi há tempos, ambas lager – uma de travo agudíssimo, pilsener lusitana, leve e ligeira, como uma daquelas canções cujo ritmo não engana ninguém, é uma cerveja fácil (lembra muito aquela canção Esquece Tudo o que te Disse). A outra, lager de lei, loira intensa, perfumada de lúpulo e nada mais, com o tom amargo de quem não aparece para enganar incautos ou iniciados (e que lembra o grande hit de Tony de Matos, «o vendaval passou/ nada mais resta…»). Desta vez, porém, menciono outra lager muito apropriada, a Coral, madeirense (relembro que apareceu recentemente no mercado a Coral Tónica, que é a aventura funchalense no domínio das stout). Bebê-la a copo ou em garrafa traduz uma distinção apreciável, sobretudo se o barman sabe tirar correctamente a cerveja. No continente, para pena minha, não se encontra em barril – mas as garrafas estão por aí, e não desmerecem a tradição de uma cerveja leve, de baixíssima fermentação, refrescante e de «coração frio» (à semelhança de muitas brasileiras, por exemplo – refiro-me à cerveja), mas que não se envergonha do seu piquinho que eu atribuo ao desejo de agradar ao gosto médio nacional. E aquele tom de frescura que acalma as papilas não é um acaso.

+MARCA: Coral
Origem: Portugal / Madeira
Álcool: 5,6%
Avaliação: **
Havia um tempo em que as cervejas eram todas iguais. Minto: em que nós, inocentes, julgávamos que as cervejas eram todas iguais. Eu recordo coisas simples, como essa. O gosto do primeiro golo de cerveja – o da primeira aventura como adolescentes. Era Verão. Tínhamos quinze anos. Dezasseis. Havia um brilho imbecil nas tardes de Verão, e um reflexo alaranjado no entardecer; nada que não venha na literatura. Romances de aventuras, policiais, séries de televisão, primeiros romances a sério, choupos à beira do rio, creme Nívea na praia, areal a perder de vista, pinhais, dunas. Posso mencionar o primeiro beijo? Posso. Essas coisas têm mais probabilidade de terem acontecido durante o Verão. Tal como a primeira cerveja. Nesse tempo havia marcas como Clock, Cergal, Marina, Cuca. Hoje, há mais marcas. Mas essas eram as dos Verões de há trinta anos, vinte anos. Seriam melhores do que hoje? Não sei. Não havia essas preocupações. Era apenas uma cerveja, uma transgressão. Outro dia, no supermercado, revi a Cergal. Vi-a em latas, verdinhas, com o complemento «Holland style» ou «Holland beer». Comprei duas latas, tal como já comprei, em alfarrabistas, livros escolares de há trinta anos – para rever um tempo. Lager clara, fria, sem ademanes. Procurei um sabor antigo mas não soube reconhecê-lo. Leve e ligeira, lembrou-me apenas que o tempo passava. Tinha um sabor simpático de lúpulo suave, trabalhado com cuidado. Era o nome da Cergal, com aquele rasto de cereal flutuante, filtrado com esmero (ah, que diferença em relação à antiga Cergal), um raio de luz na minha memória traiçoeira.

+ MARCA: Cergal
Origem: Portugal

Álcool: 4,5%

Avaliação: *

5.6.06

Em que país estava a ministra da Educação?
Beatriz Pacheco Pereira
[PÚBLICO DE 5.06.2006]

O passado é negro, mas a culpa não é, seguramente, dos professores. Os que resistiram a todos estes erros da responsabilidade do Ministério que tutela são quase heróis. Que mereciam ser estimados e bem pagos para permanecer na profissão.

Sucedem-se os ataques violentíssimos aos professores como únicos responsáveis pelo desaire do ensino público (note-se, público, não privado, como se eles não fossem os mesmos...).
Caso é para perguntar à sra. ministra onde andava e que informação tinha sobre o que se passava, de há trinta anos para cá, no Ministério que agora tutela. Ninguém chega a ministro sem saber o que está para trás. Mas nada se nota. Se não está bem informada do passado, aqui ficam alguns dados que explicam bem como se pode ter chegado aos descalabro que apregoa.
Pergunta-se pois, sra. ministra, onde andava quando o seu Ministério...
1- ...aprovou cursos de professores primários em que se proibiam as cópias e a memorização da tabuada (Institutos Piaget e quejandos...)
2- ...deixou professores primários dar aulas em aldeias remotas em escolas sem água, sem luz e com alojamentos dignos de eremitas? E todos ou outros em verdadeiro trabalho missionário por esse país fora?
3- ...deixou que o concurso de professores enviasse, anos e anos a fio, pessoas com uma qualificação de nível superior (as que devia mais estimar) pelo país inteiro, à custa de suas famílias destroçadas e dos filhos que não podiam ter ou ter consigo?
4- ...ignorou ostensivamente que eles pagavam os transportes do seu bolso, viajando 100-120 quilómetros até, sempre sem qualquer ajuda de custo, diminuindo dramaticamente os que lhes sobrava no fim do mês? Não seria isto imoral e desumano?
5- ...teve inúmeros ministros que se sucediam a ritmo alucinante, cada um puxando pelos seus galões de docentes universitários, vomitando reformas continuamente e sempre sem ter em conta a sua adequação, implementação e financiamento?
6- ...deixou que a dotação financeira de uma escola secundária fossse absolutamente ridícula durante décadas, mal dando para pagar a água, luz, os edifícios escolares se degradassem de tal modo que nenhum professor se aventurava nas instalações sanitárias dos alunos, e não havia recintos desportivos ou actividades extra-escolares?
7- ...permitiu horários dos alunos que alcançam as 8-9 horas por dia, uma carga insuportável para qualquer pessoa? (tive uma turma destas este ano lectivo, e eu dava a 9º aula do dia...)
8- ...não se preocupou com o tempo de estudo dos alunos. Quantas horas sobram semanalmente para os alunos estudarem? Na escola, onde se pode estudar se não há salas de estudo organizadas e, em muitas, as bibliotecas, se funcionam, não têm espaço para tal? Será em casa, à noite, com pais que se demitem cada vez mais da sua função de vigilantes e educadores?
9- ...esvaziou o quadro das escolas de funcionários, deixando que sejam poucos, mal preparados e pouco mais do que empregados de limpeza?
10- ...obrigou os professores (especialistas nas suas matérias, não se esqueçam) a passar muitas horas extra-horário, a fazer tarefas administrativas que antes competiam aos funcionários não-docentes, ou então em reuniões absolutamente improdutivas mas obrigatórias? Não sabia que os professores já passavam muitas noites e fins de semana a preparar aulas e material lectivo?
11- ...permitiu que o Sistema Disciplinar se esvaziasse, em nome da retenção quase obsessiva de alunos dentro de portas e do aumento da população discente nas escolas, minando sistematicamente a autoridade dos professores? Este ano, sei que alunos com comportamentos irregulares, e até criminosos, com 20 ou mais participações disciplinares, não foram expulsos nem submetidos a nenhum programa de reabilitação por especialistas credenciados... Porque reduziu o Ministério o poder de sanção dos professores?
12- ...só deu atenção ao número de computadores por escola e ao acesso à Internet mas não permitiu aos alunos compreender o poder dos media? Afinal os alunos passam o resto do escasso tempo diário a ver uma televisão que lhes mostra só publicidade de telemóveis, futebol, escândalos e anedotas... Os valores dos jovens hoje são ensinados pelo matraquear de televisões mal regulamentadas. Porque não age o Ministério sobre elas também? Porque será que abdicou da sua função reguladora deixando que canais abertos dêem pornografia encapotada, publicidade que ofende os direitos humanos e dos animais, programas impróprios a horas do jantar? Porque nunca interagiu o Ministério da Educação com o da Cultura?
13- ...permitiu que se extinguissem os Exames por puras razões estatísticas? Ninguém no Ministério sabia que era preciso separar os que sabiam dos que não sabiam, e desde o início da escolaridade? Porque facilitou sempre a passagem dos que tinham níveis negativos?
14- ...deixou que as escolas tivessem apenas um psicólogo (quando o tinham, claro) que além de fazer sozinho a orientação vocacional, não tinha tempo para lidar com os casos mais graves que surgiam nos alunos? Porque, entre eles, não havia futuros desajustados da sociedade, nem doentes mentais, nem vítimas de abuso sexual, nem de violência doméstica, nem problemas de droga. Ou havia?
15- ...não se deu conta da crescente feminização das nossas escolas? Por que razão isso aconteceu, é simples - ser professor era (é) das tarefas mais exigentes, mal pagas, de carreira mais difícil e incerta. Portanto, óptima para o lado mais fraco da nossa sociedade. Depois, com algum malabarismo, ainda deixava algum tempo livre para as tarefas domésticas. Os homens, simplesmente não se sujeitavam a isto e partiam para outras profissões, mesmo dentro da função pública como para repartições e organismos de gestão do Ministério da Educação. Esta acomodação a padrões de sociedade retrógrados nunca incomodou o Ministério? (A propósito, os professores-homens estão a voltar ao ensino, não porque sintam vocação, mas porque há falta de empregos...)
Podia continuar estas interrogaçãoes que apontam para coisas que a sra. ministra, estranhamente, prefere não falar. O passado é negro, concordo, as estatísticas não se podem ignorar, mas a culpa não é, seguramente, dos professores. Porque os que resistiram a todos estes erros da responsabilidade do Ministério que tutela são quase heróis. Que mereciam ser estimados e bem pagos para permanecer na profissão. Sabe a sra. ministra porque é que, em Inglaterra, já ninguém quer ser professor e andam à procura deles em Espanha e até em Portugal? Professora do ensino secundário (bpachecop@hotmail.com)